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Publicado em 08/09/2016

Projeto que anistia envolvidos em caixa dois começa a tomar forma (Valor Econômico)

Já circula no Congresso Nacional e no Executivo a minuta de um projeto de lei para anistiar empresários, políticos e partidos envolvidos em doações irregulares a campanhas políticas, com o objetivo de superar o capítulo da Operação Lava-Jato. A ideia é criminalizar daqui pra frente as doações feitas em desacordo com a lei, perdoando o passado, em contrapartida, para aqueles que confessarem a prática à Justiça Eleitoral.

O texto, que está pronto, partiu do meio empresarial, mas beneficia também a outra ponta. A minuta isenta de penas criminais empresários que fizeram doações não declaradas a candidatos e partidos. Quem recebeu as doações também ficaria livre de punição, seja candidato, partido ou terceiros, como prestadores de serviço.

Defensores da medida já sondam também integrantes da cúpula do Judiciário por apoio. A ideia é incluir o texto como uma emenda substitutiva a um conjunto de propostas que tramitam juntas na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara e tratam de financiamento eleitoral - a maioria para criminalizar o caixa dois de campanha.

Segundo o deputado Hildo Rocha (PMDB-MA), vice-presidente da comissão, vários deputados e partidos estão envolvidos nas negociações. "O entendimento é que quem recebeu no passado caixa dois referente a propina não tem perdão. Agora, se foi dinheiro dado sem nada em troca, pode anistiar", afirma. "Não pode punir da mesma forma duas coisas distintas", diz.

A anistia se daria na prática como uma espécie de Refis eleitoral. Os interessados teriam que confessar que fizeram ou receberam doações irregulares, indicar o outro lado envolvido na transação e pagar multa de 35% sobre o valor. Para isso, entregariam um "termo de colaboração" ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que centralizaria os dados das confissões. Quem aderisse perderia a condição de réu primário, mas estaria livre de punições.

A proposta não livra apenas as situações de caixa dois, as doações não declaradas. O texto prevê a anistia para todos os casos de doações "em desacordo com a lei", o que abrange também contribuições de entidades que não podem doar para campanhas - como sindicatos-, ou que ultrapassem os limites previstos na legislação. O presidente Michel Temer é um dos que está inelegível por doar, na campanha de 2014, mais do que a lei permitia.

Atualmente, a doação eleitoral irregular não é crime penal em seu enquadramento mais restrito. Mas tem sido frequentemente interpretada de forma mais ampla pelos investigadores da Lava-Jato, seja como corrupção ou lavagem de dinheiro. Por trás da proposta de anistia está a justificativa de que as doações ilegais até aqui eram a regra do jogo e que, a partir de agora, haveria um compromisso de mudar essa cultura por meio da criminalização.

O projeto, ao qual o Valor teve acesso, prevê pena de três a dez anos de prisão para pessoas físicas que fizerem ou receberem doações eleitorais ilegais daqui pra frente. Para pessoas jurídicas, a pena seria a proibição de contratar com o poder público ou obter subsídios por até oito anos.

A principal modalidade beneficiada, segundo os articuladores, seria a doação por meio de contrato fictício com terceiros - como serviços de publicidade ou impressão em gráficas, por exemplo. Se o dinheiro foi inserido falsamente como despesa nas contas da pessoa jurídica, seria necessário retificar a declaração de Imposto de Renda para retirada do valor.

Dificilmente pegos em investigações criminais clássicas, os contratos fictícios de prestação de serviços usados para justificar doações irregulares de campanha começaram a aparecer principalmente nas delações premiadas da Lava-Jato. Entre as que estão para ser fechadas, uma das mais temidas pelo setor empresarial é a do publicitário João Santana, que poderia trazer citações a diversas fontes pagadoras, segundo fontes envolvidas nas articulações do projeto.

Os proponentes defendem que a proposta não livraria pessoas envolvidas no crime de corrupção. Conforme a jusrisprudência dos tribunais, esse crime só se materializa com a demonstração do "ato de ofício", ou seja, a contrapartida oferecida em troca ao pagamento da propina.

Na Lava-Jato, porém, as doações ilegais aparecem de forma tão disseminada que revelariam, para além dos casos mais clássicos de corrupção, uma relação promíscua entre agentes públicos e empresariais, o que tornaria muitas vezes difícil apontar um "ato de ofício" claro para cada transação financeira. Segundo os defensores da anistia, essas situações é que seriam beneficiadas pela medida.

De acordo com Hildo Rocha, não há acordo para votar a proposta nem na comissão nem no plenário. E, no jogo política, a possibilidade de anistia para grupos adversários pode dificultar a aprovação. "Se for para anistiar os petistas de responderem as acusações da Lava-Jato não tem chance de passar", diz o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), da Comissão de Finanças.

Para o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), autor de um dos projetos para tornar crime o caixa dois de campanha, a exigência de que os infratores confessem é interessante, por seguir a linha da colaboração premiada, mas acaba no fim por consagrar a impunidade. "O valor arrecadado com multas seria insignificante perto dos problemas orçamentários da União e a anistia premia quem obteve o mandato com a transgressão as leis", critica.

O projeto se soma a outras alternativas em gestação entre políticos, escritórios de advocacia e nos meios empresariais, com o objetivo de conquistar uma anistia para os envolvidos na Lava-Jato. O Valor revelou em agosto que propostas nesse sentido são debatidas nos bastidores. Poderiam ser incluídas tanto em meio às negociações das dez medidas anticorrupção, apresentadas pelo Ministério Público e em discussão na Câmara, como em meio à reforma política. O ponto em comum é distinguir as ideias de caixa dois e propina, perdoando o primeiro.

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