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Publicado em
17/12/2020
Nem parece banco. A porta giratória sumiu. O caixa, também. O cafezinho com o gerente continua existindo, mas em alguns casos ele é servido por um barista. Em busca de um melhor relacionamento com os clientes e de reduções de custos de até 40%, os bancos têm adotado um novo modelo de agências. Nele, saem de cena as transações e as filas e entram os serviços de assessoria.
Esse processo já vinha em curso, mas a pandemia deu força a ele. O movimento nas agências caiu mais de 70% nesse período, e não há nenhuma indicação de que voltará ao que era. Durante a crise do coronavírus, os canais digitais chegaram a representar 74% das transações de pessoas físicas, segundo a Febraban. Porém, há instituições financeiras em que internet banking e mobile banking já somam 98% das operações, caso do Bradesco.
Na pandemia, movimento nas agências caiu mais de 70%, e não há nenhuma indicação de que ele voltará ao que era
“Há uma necessidade de renovação sem perder o conceito de presença. Entendemos isso como a integração do físico com o digital”, afirma João Carlos Gomes, diretor-executivo do Bradesco.
O banco da Cidade de Deus (SP) anunciou em outubro um amplo programa de reestruturação da rede física, que contempla o fechamento de 400 agências e a conversão de outras 700 em unidades de negócios neste ano e um número ainda não revelado em 2021. Estas são estruturas mais enxutas, sem boca de caixa, voltadas a negócios e relacionamento com clientes. Na prática, serão postos de atendimento que ficarão ligados a uma agência maior na mesma região - onde, aí sim, continuarão sendo realizadas transações financeiras.
Quando apresentou o desenho, em outubro, o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari Jr., afirmou que a estrutura permite diminuir de 30% a 40% os custos dessas agências. A maior economia vem do fato de que o manejo de numerário deixa de existir, o que diminui gastos com logística, tesouraria e segurança.
As unidades de negócios ainda devem passar por uma mudança de visual e, em algumas localidades, a ideia é que também promovam palestras sobre educação financeira, economia e outros temas relacionados. Com isso, afirma Gomes, o objetivo é estreitar o relacionamento com clientes.
Há mais tempo nesse processo, o Santander passou a chamar suas agências de lojas. “São mais um ambiente de convivência do que um lugar que se pareça com uma agência clássica”, afirma Ede Viani, vice-presidente de tecnologia e operações do banco.
Das 2.168 agências que o Santander tinha no fim do terceiro trimestre, cerca de metade estava equipada com redes WiFi, com o objetivo de permitir que os gerentes ajudem os clientes a fechar suas transações por meio do aplicativo do banco. Em algumas unidades, há também uma cafeteria dentro das lojas, com a intenção de que sejam usadas como espaços de convivência. No Work/Café, com seis unidades em São Paulo e no Rio, os clientes podem reservar salas de reuniões para usar num esquema de coworking.
No ano passado, o Banco do Brasil (BB) também anunciou a conversão de 333 agências em postos de atendimento, enquanto outras 634 tiveram o status reduzido. Esses locais se organizam em torno do que a instituição chama de agências “hub”, que funcionam como estruturas mais completas. As operações de backoffice também foram retiradas da rede física e passaram a se concentrar nas áreas administrativas, de forma que as equipes das agências se dediquem apenas a fazer negócios.
As mudanças também vislumbram uma melhoria de imagem. Ir a uma agência bancária no Brasil costuma ser uma experiência ruim, com a chateação de passar pelas portas giratórias e, muitas vezes, filas demoradas.
Por isso, o processo de conversão de agências tem sido muitas vezes acompanhado da adoção das chamadas caixas recicladoras - terminais de autoatendimento em que o dinheiro depositado é o mesmo usado para saque. O custo desses equipamentos é maior que o de um ATM convencional, mas a logística do numerário fica com o prestador de serviços e não com o banco, que dessa forma não precisa manter uma tesouraria no local. Sem cofre do lado de dentro, as agências podem abrir mão das portas giratórias.
Com a disseminação dos recicladores, cenas como as tentativas de assalto vistas há duas semanas em Criciúma (SC) e Cametá (PA) também tendem a se tornar mais raras, já que passa a haver bem menos dinheiro nas agências bancárias.
De acordo com Viani, o Santander já usa recicladores em cerca de 400 unidades e tem a expectativa de adotá-los em mais 200 no próximo ano. O Bradesco também está encampando esse modelo, que ajuda a melhorar a experiência, afirma Gomes.
O novo modelo tem levado à redução dos espaços físicos e, em muitos casos, do pessoal alocado nas agências. E a despeito do que defendem os entusiastas das fintechs e dos bancos digitais, a rede física parece longe de ser extinta. No fim de outubro, o país contava com 19.553 agências e 18.489 postos de atendimento, de acordo com dados do Banco Central (BC).
“Os clientes ainda buscam aconselhamento nas agências e muitas vezes querem tratar de forma presencial operações mais complexas, como o crédito consignado, mesmo elas estando disponíveis nos canais digitais”, afirma Gomes, do Bradesco.
“Acreditamos em distribuição física, especialização e conveniência”, diz Viani, do Santander. “Não achamos que tudo é digital.”
Embora haja fechamento de agências nos grandes centros urbanos, em alguns casos ainda há expansão da rede física. O Santander, cuja estrutura de atendimento é menor que a dos concorrentes, ainda vê espaço para ampliar sua presença física no Centro-Oeste, no Norte e no Nordeste. Nesse processo de interiorização, a aposta é nas chamadas lojas especializadas. O banco já tem 50 lojas voltadas ao agronegócio e planeja chegar a cem. Também há planos de ampliar os locais focados no microcrédito e na clientela de alta renda.
A Caixa também ampliou sua rede, com o objetivo de cobrir todo o território brasileiro. O número de agências se manteve praticamente estável neste ano em 3.372 unidades, mas o banco reforçou a presença por meio de correspondentes bancários, que são 8.591, e postos de atendimento (784 no total). O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, afirma que a presença física é essencial para a instituição financeira, tanto por ser a distribuidora de benefícios sociais do governo quanto pelo perfil dos clientes que atende.
Segundo Guimarães, as agências são em geral rentáveis por causa da estratégia do banco de financiar prefeituras, da receita oriunda dos programas de habitação popular e da clientela atraída por meio dos programas benefícios sociais. Por isso, a instituição vem buscando racionalizar a rede em localidades em que existe mais de uma agência e abrir unidades especializadas no atendimento a pequenas e médias empresas, mas não há urgência para reduzir a rede física.
A instituição também está incrementando as operações disponíveis na rede de lotéricas, que soma quase 13 mil unidades com potencial para a venda de produtos do banco. A estratégia é aliar o uso do Caixa Tem a essa estrutura, principalmente em municípios onde não há agência. “Com o aplicativo, dá para fazer várias coisas na lotérica sem que os lotéricos tenham acesso aos sistemas do banco”, diz Guimarães.
O Bradesco, por sua vez, também pretende ampliar o uso de sua rede de correspondentes, a Bradesco Expresso, que soma cerca de 40 mil pontos. São, em geral, pequenos lojistas que oferecem serviços bancários dentro de seus estabelecimentos. O banco tem atraído cerca de 6 mil novos participantes a cada ano. De acordo com Gomes, esse canal já é responsável por mais de 30% das aberturas de contas e ofertas de cartões de crédito e consignado. “Agora estamos levando isso para o mundo digital. O correspondente vai ter um QR Code para vender produtos aos clientes”, afirma.
Maior banco do país, o Itaú Unibanco não detalhou os planos para sua rede de agências. Por meio da assessoria de imprensa, informou que está “avaliando mais de um movimento relevante nesse contexto, novamente com foco no cliente e nas transformações digitais pelas quais já temos passado”. De acordo com o banco, o modelo também beneficiará os funcionários, “com foco em modernização e no futuro do trabalho”.